Kelly's Pub
- Boa noite! O Senhor deseja algo?
- Desejo meus anos de volta, com todos os
aprendizados que recebi nesses últimos 47 anos e uma dose do seu melhor ouvido
pela próxima noite. Meu jovem posso parecer um velho acabado, debruçado sobre
seu balcão, arranhado e grudento, mas já fui como você e todos sentados aqui,
sem muita experiência, cheio de vontade e com um desejo insaciável por
aventuras.
Bem, em uma noite, deixe me pensar, à mais ou
menos uns 28 anos atrás, eu estava na esquina desse bar, bem, como posso falar
sem parecer imbecil? Conhecendo uma jovem assim por se dizer, mal poderia saber
que, a partir daquele momento, me tornaria o que sou hoje, procurado não apenas
pela polícia, por um dos mais astutos assaltos com reféns, éramos cinco,
naquela tarde ensolarada de terça-feira, entramos as 15:37, haviam poucas
pessoas trabalhando naquele dia, sete ao total e clientes eram onze, havia uma mãe
com uma criança de colo, lembro daquele menino de olhos castanhos escuros, que não
parava de chorar e por isso liberamos, tanto ele como sua mãe que fedia a
vômito fresco poucos minutos depois, você sabe o que fazem com assassinos de crianças
em presídios? Bom, não queira saber.
Como eu dizia, ficaram dezesseis reféns ainda,
pedimos para que enchessem as malas com rapidez, não queríamos demorar muito lá
dentro para não haver ainda mais complicações do que já havia ocorrido, aquele
banco cheio de lustres e desenhos de anjos já estava cercado de policiais, e
isso já passava das 15:51, a cada minuto que passava, ficávamos ainda mais apreensivos,
quando um de meus parceiros disse que deveríamos negociar com o Chefe da operação
Carlos, que me parecia um bom homem, apesar de estar querendo me prender.
- Negociações nunca dão certo.
- Não interrompa! Carlos fez muitas propostas, mas
todas elas nos deixava de mãos atadas e sem nenhum refém, foi quando olhei para
a linda moça que havia conhecido na noite passada e cogitei desistir dos meus
parceiros de anos, e comecei pensar apenas em mim e nela, eu sei meu jovem
parece um tanto quanto egoísta, não é mesmo? Ainda mais se pararmos e pensar que
não fazia nem 24H que nos conhecíamos, chamei para longe e conversamos por
quase uma hora, planejamos o que faríamos e chegamos a uma única solução.
Ela foi chamar o restante do grupo e ficou
enrolando enquanto isso liguei para o Chefe Carlos e fiz de conta que era um refém
e passei informações de como sua equipe deveria proceder, expliquei onde “nós reféns”
estávamos, e quantos eram os “assaltantes”, por onde era melhor sua entrada e
em que momento, prometi que na hora chamaria a atenção de meus cúmplices e
criaria uma distração para a equipe de Carlos ser bem sucedida.
Feito isso, voltei para perto da moça e acertamos
os últimos detalhes, isso era 16:50, fazendo parte do nosso plano, ordenei que
eles fossem para perto dos reféns, como havia combinado com Carlos alguns
minutos antes, peguei a moça pela mão e falei que iríamos estudar uma rota de
fuga para todos, foi quando começamos nossa própria fuga.
- Abandonasse seus amigos por uma única mulher,
mas...
- Meu jovem, tenha calma. Subimos para o terceiro
piso, lá tinha uma escada externa em caso de incêndio, esperamos pelo lado de
dentro da janela, até escutar o estrondo da porta de baixo romper o silêncio no
prédio, foi quando eu sai primeiro, e ela foi logo atrás de mim, tão rápido quanto
conseguia, mal consegui ar suficiente, era como se meu pulmão tivesse parado, num
estante estávamos na calçada, com três malas, e dentro de cada uma delas havia
mais ou menos R$700 mil, e logo estávamos andando na rua como se fossemos
curiosos pelo acontecimento, apenas turistas enxeridos. Meus amigos, assim como
você falou, foram pegos, dois deles acabaram morrendo, um por um policial e
outro não encarou muito bem o fato de ser preso, e antes mesmo que alguém pudesse
ter feito algo puxou o gatilho se despedindo desse mundo, o outro foi preso,
julgado e condenado, deixando bem claro que tudo o que aconteceu naquela tarde
foi a meu mando, assim que soube disso sumi, abandonei a moça e o bebê que ela
esperava.
A propósito, o nome da moça era Kelly!
- O que?!!!
- Isso, Kelly, soube que ela usou o dinheiro
daquele dia para comprar esse bar, criar seu filho, ter uma vida tranquila,
soube também que seu filho tem os olhos do seu pai, tão claros quanto água
cristalina, meu jovem já reparasse que seus olhos brilham tanto quanto os meus
em noites mais estreladas!
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